Como me tornei psicóloga [adaptado] | by iwonderduda | Jul, 2025

Zoom image will be displayed

Imagem de referência: https://www.flickr.com/photos/paperworker/10049391934/

Nota: esse texto foi feito como parte de um trabalho final da faculdade de Psicologia, apresentado em sala de aula em 17/06/25.

Pego palavras emprestadas — e uma parcela de licença poética — para começar esse texto dizendo: nós somos mais do que um conjunto de moléculas, resquícios de supernova, carne e osso. Somos feitos de memórias. Lembranças múltiplas que se acumulam e se sobrepõem ao longo do tempo, transformando-nos naquilo que fomos. Naquilo que somos. Naquilo que ainda seremos. Acredito que para as memórias o tempo não importa tanto — ao menos, não de forma linear.

É cercada de lembranças em sobreposição que a história de hoje toma forma. Vejam bem, eu sou e sempre fui uma inevitável contadora de histórias. Escrevi uma infinidade delas, e hoje estou aqui, entre os rascunhos do que talvez seja a narrativa mais importante que venho construindo ao longo dos últimos 5 anos e meio. Vim contar como me tornei psicóloga.

Para essa história, distorço as noções da física e adoto uma estrutura de narrativa que não é necessariamente linear. Pouco importa o que é passado, presente ou futuro, uma vez que todas as minhas versões coexistem no agora. Enquanto as minhas memórias estiverem vivas, elas jamais terão um fim. No final das contas, o tempo cronológico é só uma unidade de medida.

Se perguntarmos a qualquer dessas Dudas porque escolhemos Psicologia ao sairmos do ensino médio, elas responderão de formas diferentes. Foram as horas acolhendo, mesmo tão jovem, às pessoas queridas e aquilo que doía em silêncio. As noites escrevendo romances que brincavam entre o real e o imaginário. O desejo de saber o porquê as pessoas fazem o que fazem, porque Deus, como podem?! Vontade de oferecer aos outros o que não tive tão cedo e uma conversa com o que chamei de universo na época: Escrita criativa ou Psicologia. Onde der bolsa, eu vou. A decisão tá nas tuas mãos.

Psico. Então é isso.

Se a ciência ou o acaso não explicarem como essa escolha deu tão certo, vou jogar no colo desse tal de universo outra vez.

Queria dizer que o caminho ao longo desses 11 semestres foi fácil, mas estaria contrariando a minha própria máxima de que o esforço recompensa. Ao me tornar estudante de Psicologia, não deixei de ser nenhuma das Dudas ou desocupei meus outros papéis. E a vida continuou acontecendo, porque, de fato, ela nunca deixa de acontecer, mesmo quando precisamos de 15 minutos para fazer chover nossas dores. Assim a gente é tempestade no ônibus de volta para casa. No corredor da faculdade. Na casa das amigas. Às vezes é tempestade sozinha, mas em outras está muito bem amparada. Afinal de contas, todas nós temos batalhas para enfrentar, dores para sentir e alguns caminhos para deixar. Comigo não foi diferente.

Mas que lindo poder dizer que, ainda que chovendo e trovejando dentro de mim, enquanto a vida acontecia e a graduação também, conheci pessoas que fizeram uma diferença enorme nessa jornada. A Duda nunca foi Duda sozinha. Não seria Duda-só em qualquer tempo verbal ou cronológico, porque nós nos (re)construímos e (re)descobrimos em relação. E eu me emociono em poder dizer que conheci pessoas fantásticas, que estiveram comigo na chuva e nos dias de sol também. Gente que me fez perceber que o verdadeiro potencial para fazer brilhar sempre esteve aqui. Família. Amizades sinceras, as novas e as antigas. Professoras. Supervisoras. Minhas psicólogas. Estranhos que se tornaram conhecidos. Crianças, adultos e adolescentes.

Em cinco anos e meio, a graduação foi mais generosa comigo do que posso mensurar. Preciso dizer que sim, nós aprendemos com as dificuldades e com as dores, mas também com o afeto que transborda. E como transborda e ensina. Transbordou tantas vezes, que agora percebo que tempestades também podem trazer a sensação de acolhimento. Eu tinha certeza que choveria hoje. Chuva de alento, ternura e sensação de que deu certo. Acho que, no fim, me construí enquanto psicóloga aprendendo o tempo todo, em uma realidade em que sol e tempestade (minha e tua) coexistem em um espaço-tempo que não é necessariamente cronológico.

Eu me tornei psicóloga com o ProUni. Me tornei psicóloga enquanto também sou escritora. Me tornei psicóloga ocupando muitos outros papéis. Me tornei psicóloga estando curiosa, dedicada e criativa. Sendo monitora ao menos cinco vezes. Aprendendo que todas as partes de mim são importantes. Me tornei psicóloga ao descobrir que, quando as frases são longas demais e as palavras já não fazem sentido juntas, pontos finais são melhores do que vírgulas. Me fiz psicóloga deixando ir e deixando chegar. Recebendo apoio, incentivo e amparo. Me fiz psicóloga descobrindo novos sentidos. Me fiz psicóloga em relação, porque não seria nenhuma dessas versões em confluência, sozinha. Me fiz psicóloga enquanto defendia, com intensidade, que demonstrar vulnerabilidade é um ato de coragem. Me fiz psicóloga aprendendo a olhar para aquilo que também fortalece. Me fiz psicóloga entendendo que os livros também podem mudar realidades. Me transformei psicóloga prometendo que não pararia de acreditar. Me transformei psicóloga por sede de conhecimento, impulso em descobrir e necessidade de ajudar. Me transformei psicóloga rabiscando, brincando e oferecendo afeto. Me transformei psicóloga entendendo que, às vezes, basta que alguém te perceba genuinamente para que toda a realidade ao seu redor também cresça em metamorfose.

Me tornei psicóloga tecendo laços significativos, com muitas Dudas coexistindo em mim enquanto a vida acontecia. Sim, às vezes chove, às vezes faz sol e às vezes os dois num mesmo instante. Mas, para além do tempo e da noção de passado-presente-futuro, me tornei psicóloga construindo memórias e tendo a certeza de que nós, em essência, também podemos transformar.

Source link

Leave a Reply

Your email address will not be published. Required fields are marked *